28.1.07

Todo camburão tem um pouco de navio negreiro

Acabei de ler o Rota 66, de Caco Barcellos. Junto com o Estação Carandiru, de Dráuzio Varella, formam o par de livros que, acho, todos deveriam ler.

Rota 66 vem ao encontro do que eu venho pensando a tempo. E observando. Até já tinha comentado que na micareta vi muitas revistas policiais, o que é bom, mas com um único tipo de gente. Todas, todas as vezes que vi policiais revistando alguém, eram homens, jovens, pobres e negros. O mesmo perfil das vítimas da Rota, segundo Barcellos. Ele descobriu que dos 4 mil e tantos homens mortos pelo destacamento, em duas décadas, quase 100% era inocente e estava desarmado. Alguns tinham passagem pela polícia por furto, briga de rua. Quase nenhum tinha matado alguém. Menos de dez eram brancos. Três eram ricos.

Por que as coisas são assim? Outro dia ouvi de um amigo, pessoa com um nível de escolaridade alto, que no Brasil não tem tanto preconceito assim não. Eu disse que ele não tem motivos para não pensar assim. É rico. E branco. E com certeza nunca foi parado pela polícia enquanto passava na rua. Mas conheço gente que é suspeito - e é parado pela polícia regularmente - porque é pobre e preto. Gente que nunca fez nada, nem uma briga de rua. Menino que trabalha todo dia no pesado. Mas tá na cara que é ladrão. Que porra!

Acho que a polícia age de acordo com a sociedade que tem. E quero acreditar que essa polícia é uma minoria. Quero mesmo. Mas enquanto lia o livro, alguém visitou meu orkut e fui lá ver. Puta-que-o-pariu: era um cara da Rota!! Juro que não acreditei. Mas ele tinha foto da insíginia, a mesma da capa do livro, e várias outras no mesmo estilo. Me assustei com o jeito do cara. De justiceiro, mesmo. Cheio de frases da Bíblia, pra justificar a missão divina. Será que todos eles pensam assim? Que são enviados para perseguir e matar quem, para eles, parece bandido?

Tenho muito mais a falar sobre isso. Mas está passando um filme na televisão sobre essa relação toda: Uma onda no ar, de Helvécio Ratton, inspirado na história real da Rádio Favela, de Belo Horizonte. Eu vou assistir. Ah, é TV fechada, TVLocal36.

Um comentário:

Mi do Carmo disse...

"Uma onda no ar", muito bom o filme, é sem dúvida, recomendável. Jovens que passam por cima do preconceito na boa.

O título do post é uma das frases que mais gosto. De uma música do primeiro cd do Rappa, chamado O Rappa que quase ninguém conhece. O que é um desperdício porque tem lindos poems musicados.

O livro é excepcional. Um dos maiores exemplos de jornalismo investigativo que eu conheço. E é revoltante também. Lembro que a medida que as palavras eram lidas, as lágrimas caim do meu rosto: "Por que é tudo tão injusto?"

A questão do preconceito é bem complicada. Extensa e desgastante. E não é levada a sério. As pessoas pensam que não tem preconceito, que é um país democrático...

Gostei do "Que porra!"! Agressivo, como o nosso sistema policial da porra que é uma desgraça mesmo. E não penso como você, que é uma minoria, acho que 70% dos policiais são corrompidos e desonestos com os propósitos de proteger a população.

Vou levar outro livro...

Beijos Shil.