13.3.09

Silenciosos, assistindo

Dudu precisava tirar um extrato no Banco do Brasil. Era por isso que eu estava parada na praça, atrás da banca, por volta das 18h30.

Quando desci da moto já tinha um aglomerado de gente. Vendedores que acabavam o expediente, clientes retardatários, pessoas que passavam. Não era a típica roda fechada que se forma quando acontece algo na rua. Estavam meio espalhados, silenciosos, assistindo.

O centro das atenções era um menino de cerca de nove anos. Ou mais que isso. Não é possível precisar a idade correta quando o corpo é franzino e a atitude, combativa.

Senti muita falta do meu celular naquela hora. Eu tinha que ter filmado aquela cena.

Em cada uma das mãos e em um dos pés, o menino tinha um policial. Três homens adultos, grandes e fardados, tentando barrar os movimentos de onda que o menino fazia. Se remexia com força e chorava. Chorava um choro fino de criança - "me solta, me solta" - mesclado por velhas expressões - "me solta, filho da puta".

Dois meninos mais velhos, acompanhavam tudo, silenciosos, encostados na árvore. Provavelmente eram conhecidos, ou já não estariam ali. Me pareceram, os três, engraxates, mas não posso garantir se tinha alguma caixa por perto. Com certeza, eram meninos soltos...

Achei estranho que os policiais falavam baixinho com o menino: "Assim você vai se machucar, fica quieto pra você não se machucar". Me soou meio falso, mas como eles estavam rodeados de gente, ou de testemunhas, compreendi.

O rapaz da loja de eletrônicos teve coragem de falar: "Deixe ele ir pra casa, moço. Deixa o moleque ir embora". O policial que segurava a mão direita, muito educado, explica: "Se eu soltar, ele não vai pra casa. A gente vai botar ele na viatura e vai levar pra casa".

Com o extrato na mão, Dudu voltou e subi na moto de novo, para voltar pra casa. Mas a cena foi comigo. Enquanto fazíamos a volta, me senti impotente e revoltada. Não sei se é porque sou mãe agora, e mãe é assim mesmo, mas fiquei pensado "e se fosse meu filho?".

Não é sentimentalismo não. Mas é que... porra! Vão levar pra casa. Simples. Mas como é a casa desse menino? Como é o pai, a mãe? Ele tem pai e mãe? O que se passa lá? "Vai deixar ele roubando na rua?" Se ele estava mesmo roubando, no fundo da questão, a culpa não é dele.

Esta porra de país não dá educação, condição de vida, saúde, nada. Aí fica buscando solução - diminuir a maioridade penal, criar outros "centros de recuperação", prender, matar. Ah, tá certo, tudo isso é mais fácil do que se meter a resolver a questão. Remediar, porque prevenir é um buraco bem mais embaixo.

Poucas horas antes tinha visto na internet uma ilustração do Angeli, que entre muitas, foi a única que copiei pro computador. É estranha a capacidade de alguém traduzir seu pensamento de forma tão simples. É mais estranho do que a coincidência.


2 comentários:

Michele do Carmo disse...

A educação não é levada a sério nem quando se propõe uma discussão séria sobre a educação. Veja a avalização do IRDEB, por exemplo, tapando o sol com um canudinho.

Duas vidinhas em minhas mãos! disse...

Puxa, as vezes pra a gente viver temos q fechar os olhos para a realidade cruel...
Mas, eu lendo isso e lembrando de tantas outras histórias, dá um desespero e um desânimo.
Vejo-me na minha profissão e o q eu posso fazer? É triste, pois a educação não tem vez, e nós professores muitas vezes causamos um verdadeiro enchaço e nada se resolve...
Q sensação horrível, e a culpa é de quem???