31.3.09

O peixe

Duda fez sete anos e a titia resolveu dar chocolates e um peixinho de presente. Só que a titia aqui não imaginava a odisséia que enfrentaria para comprar as tais lembranças.

O Carassius auratus é um peixinho ornamental conhecido por aqui como peixinho-dourado ou
cauda-de-véu. Acabei de descobrir que ele é uma das espécies mais manipuladas pelo homem e que pode crescer até os 30 (trinta!!!) centímetros.

Aproveitei um brecha no trabalho e fui na loja de peixes. A única coisa definida era que eu queria o cauda-de-véu. Sempre quis uma cauda-de-véu: acho lindo! Até pensei em comprar um pra mim e pro meu filhote, mas... 30 centímetros? Só se for pro almoço...

Na loja, fui atendida cordialmente por uma moça, que me explicou como seria cuidar do bendito peixe, do que eu precisaria para montar o aquário e tal. Eu teria que voltar à loja ao meio-dia para levar o aquário montado. Paguei no cartão de débito e fui trabalhar feliz da vida.

Meio-dia e pouquinho, a moça não estava mais lá. No lugar dela, um rapaz me informou que eu não poderia levar o cauda-de-véu:

- Esse peixe já é de um cliente.
- Mas ela me vendeu, então o peixe é meu.
- Você pode escolher outro.
- Onde estão os outros?
- Não tem mais cauda-de-véu, você pode levar um beta...
- Meu querido, eu não quero um beta. Eu comprei um cauda-de-véu...
- Mas não tem...
- E daí? Você pode comprar o peixe em outra loja e me entregar.
- Não. A senhora leva o aquário vazio e tenta achar o peixe em outra loja.

Foi nessa hora que eu percebi que eu devo ter uma cara de besta enorme. Com um letreiro no meio da testa piscando em neon: besta, besta, besta...

- Você tá me propondo que eu saia daqui com um aquário vazio rodando de loja em loja tentando achar um peixe que vocês me venderam e não me entregaram?
- Ou então a senhora leva um beta.
- Ou então você devolve meu dinheiro, desmonta o seu aquário e eu vou comprar numa loja que preste.

Oitenta e seis dinheiros (86!!!) na bolsa de novo, saí da galeria espumando, pisando duro, retada - como se diz por aqui. Confirmando, mais uma vez, que o povo dessa cidade não sabe ganhar dinheiro.

Puta-que-o-pariu. Onde é que vou achar outro Carassius auratus numa altura dessas? Já estava procurando algumas boas desculpas para a sobrinha, quando o telefone toca (meu número tinha ficado numa nota de compra lá).

- Senhora, aqui é do aquário.
- Pois não.
- Eu queria avisar que, se a senhora ainda tiver interesse, o seu peixe tá aqui.
- Como assim?
- Eu consegui outro peixe pro outro cliente.
- Quem tá falando?
- É Fulano, dono da loja.
- Tá, fulano, passo aí pra pegar quando voltar pro trabalho.

Ele deve ter comprado o peixe na mão do outro cara. Mas isso não vem ao caso. Fato é que o bendito cauda-de-véu estava lá, num saquinho, do lado do aquário montado.

- A senhora me desculpa.
- Tudo bem. O problema foi que ele me mandou levar o aquário vazio e procurar o peixe em outra loja...
- Ele falou isso?!?!?

Aí eu parei. Não queria ser responsável por mais um na fila dos desempregados. Aproveitei para deixar meu cartão com Fulano, o dono. É que são tantas recomendações e cuidados e instruções para cuidar do peixe que eu sugeri que ele fizesse um folder.

- Liga pra mim, que eu faço esse tipo de material. Quem sabe você não me paga com um cauda-de-véu?

Foi meio sarcástico na hora, com a entonação, e tal. Mas, sei não, acho que um beta não cresce tanto...



Ps.: Conto a história do chocolate depois, porque o post ficou muito grande.

13.3.09

Silenciosos, assistindo

Dudu precisava tirar um extrato no Banco do Brasil. Era por isso que eu estava parada na praça, atrás da banca, por volta das 18h30.

Quando desci da moto já tinha um aglomerado de gente. Vendedores que acabavam o expediente, clientes retardatários, pessoas que passavam. Não era a típica roda fechada que se forma quando acontece algo na rua. Estavam meio espalhados, silenciosos, assistindo.

O centro das atenções era um menino de cerca de nove anos. Ou mais que isso. Não é possível precisar a idade correta quando o corpo é franzino e a atitude, combativa.

Senti muita falta do meu celular naquela hora. Eu tinha que ter filmado aquela cena.

Em cada uma das mãos e em um dos pés, o menino tinha um policial. Três homens adultos, grandes e fardados, tentando barrar os movimentos de onda que o menino fazia. Se remexia com força e chorava. Chorava um choro fino de criança - "me solta, me solta" - mesclado por velhas expressões - "me solta, filho da puta".

Dois meninos mais velhos, acompanhavam tudo, silenciosos, encostados na árvore. Provavelmente eram conhecidos, ou já não estariam ali. Me pareceram, os três, engraxates, mas não posso garantir se tinha alguma caixa por perto. Com certeza, eram meninos soltos...

Achei estranho que os policiais falavam baixinho com o menino: "Assim você vai se machucar, fica quieto pra você não se machucar". Me soou meio falso, mas como eles estavam rodeados de gente, ou de testemunhas, compreendi.

O rapaz da loja de eletrônicos teve coragem de falar: "Deixe ele ir pra casa, moço. Deixa o moleque ir embora". O policial que segurava a mão direita, muito educado, explica: "Se eu soltar, ele não vai pra casa. A gente vai botar ele na viatura e vai levar pra casa".

Com o extrato na mão, Dudu voltou e subi na moto de novo, para voltar pra casa. Mas a cena foi comigo. Enquanto fazíamos a volta, me senti impotente e revoltada. Não sei se é porque sou mãe agora, e mãe é assim mesmo, mas fiquei pensado "e se fosse meu filho?".

Não é sentimentalismo não. Mas é que... porra! Vão levar pra casa. Simples. Mas como é a casa desse menino? Como é o pai, a mãe? Ele tem pai e mãe? O que se passa lá? "Vai deixar ele roubando na rua?" Se ele estava mesmo roubando, no fundo da questão, a culpa não é dele.

Esta porra de país não dá educação, condição de vida, saúde, nada. Aí fica buscando solução - diminuir a maioridade penal, criar outros "centros de recuperação", prender, matar. Ah, tá certo, tudo isso é mais fácil do que se meter a resolver a questão. Remediar, porque prevenir é um buraco bem mais embaixo.

Poucas horas antes tinha visto na internet uma ilustração do Angeli, que entre muitas, foi a única que copiei pro computador. É estranha a capacidade de alguém traduzir seu pensamento de forma tão simples. É mais estranho do que a coincidência.


12.3.09

Vaso em crente??

Minha sobrinha Maria Eduarda é uma figura. Começou a falar super cedo. E tem umas tiradas ótimas.

Uma vez postei aqui a história do jogador que não tomava banho.

Recentemente ela saiu com essas:

- Tia, as luzes do seu prédio são todas alérgicas, né?
- Hein?
- São todas alérgicas. A gente vai passando, elas vão acendendo...
- Automáticas, Duda, automáticas!

Ou então:

- Mãe, vem ver o que eu achei nessa planta! É uma semente de borboleta!

Ou ainda:

Em frente à igreja evangélica Encontro de Vasos.
- Mãe, o que quer dizer "vaso", em crente?

Todo mundo fala

Sempre reparei nas expressões ilustrativas que as pessoas usam nas conversas mais informais. São palavras e frases que se encaixam nos mais diversos contextos. É engraçado, como todo mundo fala:

Precisamos sentar pra conversar.
Não é só marcar uma conversa. É preciso sentar...

Vou guardar isso, porque amanhã ou depois, posso precisar.
Nunca é amanhã, nem depois. É um tempo impreciso...

Vai lá em casa uma hora pra gente conversar.
Não é pra ir uma hora. E é melhor avisar antes.

Oi, como vai?
Não é pra responder de verdade. A pessoa que pergunta só que ouvir: "Bem, e você?"

Qualquer dia eu apareço lá!
Não vou lá por tão cedo...

Pois não!
Sim...

Pois sim...
Não!

Coisíssima nenhuma!
O que é uma coisíssima?

Tava doida de vontade de (alguma coisa)...
Doida, doida, não. Desorientada, vá lá...

E tem mais um mundo de outros exemplos!